Saiba por que a criança e o adolescente que dormem mal tendem a engordar

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O sono sem qualidade na infância e na adolescência prejudica o desenvolvimento físico e intelectual e abre portas para doenças como hipertensão, diabetes e obesidade. Um dos motivos é que a criança e o adolescente que dormem mal tendem a se alimentarem de forma inadequada e fora de hora, sem contar que ficam mais sonolentos, irritados e cansados durante o dia. Na entrevista a seguir, a doutora e especialista em medicina do sono e em nutrição Sandra Maria Almeida Sousa Marques, da Clínica Lusíadas Almada, em Lisboa, diz como prevenir o problema.

 

OIN – Por que o sono de má qualidade é prejudicial à criança?

SANDRA MARQUES – O sono tem papel importante no desenvolvimento das crianças e dos adolescentes. Os lactentes passam de 14 a 18 horas por dia dormindo, metade das quais na fase REM (sigla em inglês para movimento rápido dos olhos). Nesta fase ocorre a maioria dos sonhos e dá-se parte da estruturação da maturação emocional. Ao longo da infância e adolescência, a duração necessária do sono e sua qualidade serão essenciais para o equilíbrio do organismo e psicoemocional. Além disso, criança em privação de sono não consegue ter desenvolvimento ótimo da atenção e apresenta dificuldade de aprender. O sono é importante na consolidação da memória, que, por sua vez, é imprescíndivel para a aquisição de nova informação.

 

OIN – Por que noites mal dormidas favorecem o ganho de peso?

SANDRA – Numa forma simples, podemos dizer que quando dormimos mal as nossas células não recebem energia suficiente. Assim, o nosso cérebro vai buscar essa energia e sentiremos mais fome de alimentos ricos em gordura e em açúcar. Isto é, vamos comer mais vezes e alimentos calóricos. Sem energia também perdemos a vontade de fazer exercício físico. Resultado: vamos comer mais e gastar menos calorias, com consequente aumento do peso. Quando esse hábito polonga-se por muito tempo, o corpo desacelera. Tudo porque dormimos pouco, mal ou nas horas erradas. Outros efeitos são a intolerância à glicose, que aumenta o risco de diabetes, e a síndrome de apneia obstrutiva do sono (interrupções breves e repetidas da respiração ao dormir, problema que, além de cansaço, irritação e sonolência, prejudica o desenvolvimento e o aprendizado, e deixa o organismo vulnerável a doenças cardiovasculares, como hipertensão).

 

 

OIN – Quais são os sintomas de que a criança e o adolescente estão dormindo mal?

 

SANDRA – Ficam sonolentas, irritadas e impulsivas. Também podem ter dificuldades no aprendizado. E os adolescentes também tendem a usar substâncias estimulantes. Existem estudos que mostram relação direta entre privação de sono e o consumo de drogas. O número de horas de sono recomendado varia com o grupo etário. Até os 12 anos nenhuma criança deveria dormir menos de 11 horas por dia. Os adolescentes necessitam de 8 a 10 horas por noite, de acordo com nova recomendação, deste ano de 2016, da Academia Americana da Medicina do Sono.

 

OIN – Algumas crianças respiram pela boca durante o sono, e outras têm o hábito de ranger os dentes. Quais são as causas?

SANDRA – Quando uma criança respira pela boca é porque tem um nariz com má função. Esta respiração oral pode, realmente, estar associada ao ronco e, eventualmente, à apneia do sono. A causa mais frequente é a hiperplasia das adenoides e o médico deve avaliar se é preciso operar. Já o ranger dos dentes, que se chama de bruxismo, pode ter várias causas. Para saber qual, deve-se consultar o médico.

 

OIN – Como é o diagnóstico e o tratamento da apneia do sono em crianças?

SANDRA – O ronco é o principal sintoma, bem como um sono muito agitado e o suor durante a noite, juntamente com o cansaço, a sonolência e a irritabilidade durante o dia e o mau rendimento escolar. Na infância, as causas mais frequentes são facilmente tratáveis: adenoides e amídalas grandes. Se a causa da apneia for palato alto ou uma mandíbula recuada ou pequena, a sua correção pode ser feita aproveitando a fase de crescimento da criança.

 

OIN- Na sociedade atual, crianças e adolescentes trocam o dia pela noite, passam horas conectados e têm pouca exposição à luz solar. Os pais devem dar o exemplo?

SANDRA – Quando os próprios pais e responsáveis têm má higiene do sono e se encontram em privação crônica de sono é difícil dar o exemplo aos filhos. Os adultos cansados têm mais dificuldade em ser firmes nos limites e nas regras de sono necessárias a um bom descanso em quantidade e na hora certa do dia. O ser humano foi, evolutivamente, preparado para dormir de noite e estar sincronizado à luz solar durante o dia. Nos últimos 60 anos, têm crescido o jet lag social. Isto é, adormece-se tarde e levanta-se cedo, seja para o trabalho, seja para a escola, resultando numa privação crônica de sono. Este fenômeno está em crescimento e, infelizmente, já se verifica entre as crianças em idade pré-escolar e é muito frequente entre os adolescentes.

 

OIN – No Brasil, crianças menores de 6 anos costumam acordar muito cedo para assistirem a aulas às 7h30. Esse horário prejudica o rendimento escolar?

SANDRA – As crianças de 6 anos devem estudar durante o periodo da manhã. No entanto, nesta faixa etária precisam dormir entre 10 a 11 horas por dia. Ou seja, para estarem na escola às 7h30 e se levantarem às 6h30 deveriam estar começando a dormir entre as 19h30 e as 20h30.

 

OIN – Quais são os principais distúrbios do sono na infância?

SANDRA – Há várias perturbações do sono em crianças e o seu tratamento varia de acordo com a causa. As frequentes são a má higiene do sono (sono insuficiente, sem hora certa e/ou nas horas erradas e com muita exposição à luz), o ronco e as parassomnias, como, por exemplo, o sonambulismo. Qualquer criança com alterações no seu sono deve ser avaliada por um profissional experiente que possa identificar estas e outras causas menos frequentes e propor um tratamento adequado.

 


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